sábado, 29 de maio de 2010

Crítica: Olhos Azuis por Celso Sabadin


Suspense não é exatamente um gênero cinematográfico tradional no cinema brasileiro. E por aqui, quando se fala em Polícia, logo o tema é associado a favelas ou cárceres. Assim, é mais do que bem-vinda a estreia do premiado “Olhos Azuis”, produção brasileira que mescla elementos de suspense, drama e policial sem cair na facilidade dos desgastados clichês que permeiam estes três gêneros.

O bom roteiro assinado por Melanie Dimantas e Paulo Halm enfoca o protagonista Marshall (vivido pelo norte-americano David Rasche) em três tempos bem diferentes na sua vida: (1) em seu último dia como policial de imigração de um aeroporto dos EUA, antes de se aposentar; (2) preso numa penitenciária e (3) embriagado vagando pelas praias brasileiras. Os primeiros minutos do filme não sinalizam em qual ordem cronológica poderiam ter acontecido estes três momentos. A narrativa é entrecortada, embaralha os tempos, atraindo desta forma rapidamente a atenção e a curiosidade da plateia, que é convidada a montar o seu quebra-cabeças dramatúrgico.

Aos poucos, novos personagens vão se agregando, e rapidamente a situação ambientada na terrível sala de imigração do aeroporto - um verdadeiro purgatório onde se decide quem vai para o Céu ou para o Inferno - vai ganhando mais força e se agigantando dentro do filme. Num ambiente claustrofóbico semelhante ao obtido por Giuseppe Tornatore em “Uma Simples Formalidade” (1994), o diretor José Joffily (o mesmo de “Quem Matou Pixote” e “Dois Perdidos numa Noite Suja”) cria com muita eficiência um clima de forte tensão, onde gradativamente se destilam os mais arraigados sentimentos de ódio, culpa e preconceito.

Apenas uma frágil divisória de vidro, com persianas mais frágeis ainda, separa a força policial norte-americana dos “cucarachas” ansiosos por entrar na tão decantada América. É um tênue “muro de Berlim” de vidro e compensado que simboliza um imenso fosso cultural e social. Ao lado de Rasche, os atores Frank Grillo (no papel de Bob), Erika Gimpel (Sandra) e principalmente Irandhir Santos (Nonato) brilham como coadjuvantes de primeira linha.

No outro tempo fílmico, Marshall aparece despido de sua carapuça policialesca, decadente e carcomido pelos caminhos do “inferno” para onde desceu: as belas praias do nordeste brasileiro, através das quais é ciceroneado por Bia (Cristina Lago), o sempre enigmático personagem da prostituta de bom coração.

Desencontradas no tempo e no espaço, as linhas narrativas se encaminham com competência para a solução final que - se não é exatamente surpreendente - tem o mérito de carregar consigo uma vigorosa discussão sobre as diferenças históricas e aparentemente irreconciliáveis que separam as civilizações dominantes das dominadas.

Um belo trabalho de Joffily, forte e corajoso, que foi o grande vencedor do II Festival Paulínia de Cinema com seis prêmios, incluindo o principal, de Melhor Filme.

LEIO O POST ORIGINAL NO CINECLICK

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente! Queremos saber a sua opinião.